quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Um mundo a ser sentido.

Um dia, passeando pelo bairro, vi um senhor tentando atravessar a rua. Eu sei que há pessoas atravessando ruas o tempo todo, mas esse senhor tinha algo de diferente: usava uma espécie de bengala e tinha os olhos fixos num ponto que eu conseguia entender qual era. Se a minha mãe estivesse ali, diria: “Olhe para os dois lados antes de atravessar!”. Até mesmo quando a rua só tem uma mão ela diz isso. E sabe que ela tem razão? Outro dia uma senhora de óculos e cabelos brancos estava dirigindo desesperada, tentando encontrar uma casa. Só que ela estava na contramão. Por causa disso todos os outros motoristas também ficaram desesperados. Ela nem percebeu. Quando finalmente achou a casa que estava procurando, estacionou como se nada tivesse acontecido, saiu do carro e abriu o portão, ignorando as palavras pouco educadas dos que estavam assistindo a cena. Já pensou se nesse exato momento eu estivesse atravessando a rua sem olhar para os dois lados?
Mas o senhor de bengala não ia poder seguir os conselhos da minha mãe. Ele era cego, não conseguia enxergar nem para um lado, nem para o outro. Só vi ele espichando a orelha (isso mesmo, a orelha!) e, então, atravessando a rua. Fiquei de boca aberta: não é que ele conseguiu perceber a hora exata em que nenhum carro estava passando? Depois pôs a mão no relógio e continuou andando, um pouco apressado.
Será que as pessoas cegas enxergam com os olhos? Ou será que elas enxergam com as mãos? Ler eu sei que elas lêem com as mãos. É num tal de braile, um papel cheio de furinhos. Elas passam as mãos e conseguem descobrir o que está escrito.
Minha mãe me disse que as pessoas que têm alguma deficiência em órgãos sensitivos (ela que me ensinou essa palavra) compensam apurando outro sentido. É mais ou menos assim: se um cego quer saber se a comida está boa, mas não consegue ver (é claro!), então ele usa seu olfato e paladar, sentindo o cheiro e o gosto da comida. E melhor ainda: pode experimentar a comida várias vezes, antes mesmo de estar pronta. Em dias de bolo de chocolate deve ser legal não enxergar...
As pessoas que não ouvem- e por isso também não sabem falar- usam as mãos para se comunicar. Isso mesmo, falam com as mãos. Como? Através de uma linguagem de sinais. Assim como existem as letras A, B, C, e todas as outras para serem escritas no papel, na lousa, na mesa (opa! na mesa não...) existem também gestos de letras. É só mexer os dedos direitinho que a gente consegue escrever qualquer palavra no ar. Mas tome muito cuidado! Não tente fazer isso sem a ajuda de um especialista, senão você pode dar nó nos dedos! Também é perigoso fazer algum gesto que... bem, você sabe...
Tem gente que tem não tem problema nenhum na língua nem no nariz, mas que não consegue sentir cheiro nem gosto direito. Nestes casos, o problema é o tempo. Quando faz muito frio o nariz da gente fica tampado, a boca fica seca e a nossa língua não consegue sentir direito toda a delícia de uma saborosa macarronada. Aliás, você sabia que boa parte do gosto que a gente sente não é gosto, mas cheiro? Por isso que com o nariz entupido a gente come menos. E você já viu alguém tampando o nariz prá tomar xarope? Pode não ser 100%, mas até que ajuda...
Já imaginou não poder sentir frio, nem calor, nem dor? Dor eu dispenso, mas o calorzinho de um dia de verão, o ar frio batendo no rosto quando a gente abre a geladeira... isso eu faço questão de sentir. A martelada na mão eu não preciso sentir, nem o corte no dedo. Epa, mas se eu não sentir o corte no dedo, como é que vou saber que estou cortando o dedo? Posso até ficar sem dedo! Cruz-credo! Tá bom, nem a dor no dedo eu dispenso!
Só sei de uma coisa: se a gente não pudesse cheirar, tocar, sentir o sabor, ouvir e ver o mundo, seria melhor que não existisse mundo. Afinal, mundo só é mundo porque a gente sente que ele existe!

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